A Sociedade Brasileira de Etnobiologia e Etnoecologia (SBEE) vem a público repudiar os crimes ambientais que acometem a costa nordestina brasileira por meio do derramamento de óleo que vem pondo em risco toda a sociobiodiversidade marinha. São, no mínimo, dois crimes: 1) O derramamento do óleo, em si, cuja origem espantosamente ainda não se sabe, estando toda a população sujeita a desinformação. Até o dia 18/10/2019 já eram 187 locais de 77 municípios, dos 9 estados nordestinos, ao menos 12 unidades de conservação, totalizando uma área de mais de 2.100km atingida por manchas de óleo. Nestas áreas encontram-se importantíssimos ecossistemas, tais como restingas, recifes de coral e manguezais, que abrigam boa parte da riqueza da biodiversidade do litoral. Associados a estes ecossistemas, existe um enorme contingente de famílias que constituem comunidades tradicionais (pescadores e pescadoras, jangadeiros, quilombolas, marisqueiras e marisqueiros, catadores e catadoras de caranguejo) que dependem, muitas vezes, exclusivamente, dessas áreas e seus recursos para a sua reprodução material, simbólica e econômica, seja na pesca ou no turismo comunitário. A segurança alimentar, a renda, o lazer, o turismo e, sobretudo, o ambiente, encontram-se drasticamente ameaçados; 2) O total descaso do Governo Federal, que mesmo tendo conhecimento há mais de cinco semanas do desastre de proporções incalculáveis, não tomou providências cabíveis para controlar os efeitos deletérios desta que pode ser considerada a maior tragédia ambiental na região. Esse descaso, em parte, é fruto da ausência de uma política responsável do (des)governo Jair Bolsonaro que, em abril, extinguiu dezenas de Conselhos da administração pública federal, entre estes, dois comitês que integravam o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Água (PNC), instituído em 2013. Para o Ministério Público Federal, a União está sendo omissa ao protelar medidas protetivas e não atuar de forma articulada no Nordeste, dada a gravidade do ocorrido e dos danos causados ao meio ambiente. Para um país megasociobiodiverso e com uma faixa litorânea gigantesca, é no mínimo estarrecedora a falta de uma política de valorização e respeito ao seu rico patrimônio biocultural. Nossa soberania está fortemente ameaçada nas mãos deste governo insano. Um país que não respeita e valoriza seu patrimônio socioambiental infelizmente está destinado ao abismo, comprometendo hoje e no futuro a vida em sua dimensão mais ampla. A Sociedade Brasileira de Etnobiologia e Etnoecologia, enquanto associação científica que preza pela conservação da biodiversidade, pelo respeito à vida, pelos direitos humanos e, sobretudo, pelos direitos dos povos e comunidades tradicionais, vem, perante a sociedade, repudiar estes crimes ambientais e o Governo Bolsonaro por sua falta de política verdadeiramente ambiental e interesse nas grandes corporações que transformam a natureza brasileira em mercadoria barata com vistas a alimentar o grande capital por meio da precarização do trabalho, da injustiça social e da degradação ambiental, traindo a soberania nacional.
Sociedade Brasileira de Etnobiologia e Etnoecologia (SBEE)
Belém, 22 de outubro de 2019.